Cotidiano

Trump reduzirá vigilância federal a abusos policiais nos EUA

WASHINGTON ? Em seus comícios eleitorais, o então candidato republicano à Presidência dos EUA, Donald Trump, costumava repetir as mesmas mensagens. Uma delas era elogiar a polícia. ?Amo a polícia, eles são os melhores?, disse ele, por exemplo, em fevereiro de 2016 em Oklahoma. Ele se lamentou, durante a campanha, que os agentes fossem mais cautelosos hoje do que nos ?bons tempos passados? e afirmou que os agentes atualmente estão temerosos de agir por medo de perderem seus empregos.

? Nós estamos nos convertendo em um país assustado e isso é muito, muito triste ? disse o republicano, que hoje ocupa a chefia da Casa Branca.

Agora, a polícia está satisfeita com a chegada de Trump ao poder. As suas primeiras decisões como presidente confirmaram as expectativas de que seria muito mais um aliado dos policiais do que foi o seu antecessor, o democrata Barack Obama. A mais importante das suas medidas neste assunto diz respeito aos agentes locais: o Departamento de Justiça não mais investigará possíveis abusos destas corporações. Este tem sido um pilar fundamental no debate sobre o tratamento da polícia para a comunidade negra dos EUA, uma discussão que ganhou força desde os protestos em Ferguson de 2014.

? Ao invés de ditar às políciais locais como fazer o seu trabalho ou gastar mal os escassos recursos rederais para denunciá-las nos tribunais, deveríamos usar o nosso dinheiro, investigação e experiência em ajudár-las a descobrir o que está acontecendo e determinar as melhores formas de lutar contra a delinquência ? disse, no fim de fevereiro, o procurador-geral dos EUA, Jeff Sessions, em seu primeiro grande discurso no cargo. ? Nos últimos anos, as forças da ordem foram injustamente culpadas pelas ações injustificadas de alguns poucos maus agentes.

A nomeação de Sessions para o cargo foi aplaudida por sindicatos de policiais, e duramente criticada por grupos que lutam em favor dos direitos da comunidade negra. O procurador foi acusado de racismo quando trabalhava no estado do Alabama na década de 1980.

Na contramão, o governo Obama conduziu mais de vinte investigações sobre a atuação de políciais locais. O resultado foi a descoberta de padrões de abuso contra a população ? e, sobretudo, contra minorias raciais. Para evitar multas ou batalhas judiciais, as corporações se comprometeram a reformar seus métodos de atuação.

As investigações de Obama evidenciaram a discriminação sistemética da polícia contra a comunidade negra em cidades como Ferguson e Baltimore, onde as mortes de dois negros desarmados por agentes da polícia desataram uma onda de protestos e um debate nacional. Sem a revolta por causa das mortes e a intervenção do Departamento de Justiça, a conduta policial dificilmente teria mudado nestas cidades.

No entanto, houve também um efeito colateral negativo. Após cada um destes protestos dos últimos três anos, a polícia se sentiu mais escrutinada. Como resposta ao lema ?As vidas negras importam? (?Black lives matter?, em inglês), que vinha dos manifestantes negros, os agentes criaram outro: ?As vidas azuis importam? (uma referência aos uniformes azuis usados por policiais).

Obama apoiou as queixas dos manifestantes e o seu pedido para que os agentes carreguem câmeras em seus uniformes, para registrar a sua conduta no cotidiano. Mas também elogiava o papel da polícia para a segurança da população. O democrata buscou um difícil equilíbrio, mas a polícia se sentiu mais atacada do que apoiada. O contrário aconteceu com os republicanos, que ergueram a bandeira para a defesa dos agentes, sobretudo depois dos ataques que mataram policiais no ano passado em Texas e Louisiana.

?Este é um problema dos sistemas, e não um problema individual de um agente?, escreveu, em artigo no ?Washington Post?, Jonathan Smith, um jurista que participou em algumas das investigações do governo Obama. ?Tolerar violações de direitos civis por parte da polícia e abandonar o poder do Departamento de Justiça para investigar más condutas simplesmente piorará as coisas e não ajudará a abordar os problemas sérios de segurança que estão sofrendo algumas comunidades.?