Cotidiano

PGR diz que defesa de Gleisi e Bernardo 'transborda o limite razoável da argumentação'

BRASÍLIA – Em parecer encaminhado ao Supremo Tribunal Federal (STF), a vice-procuradora-geral da República, Ela Wiecko, se manifestou pela rejeição dos pedidos feitos pela defesa da senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR) e do seu marido, o ex-ministro Paulo Bernardo. Ambos são investigados no STF num dos inquéritos da Operação Lava-Jato e já foram denunciados pela Procuradoria-Geral da República (PGR). De acordo com Ela Wiecko, a defesa insiste em argumentos já considerados inválidos, faz confusões técnicas que “transbordam o limite razoável da argumentação” e comete graves equívocos técnicos.

O documento foi assinado na última quinta-feira por Ela Wiecko, que está exercendo interinamente o cargo de procuradora-geral. Ela rebate os pontos levantados pela defesa de Gleisi e Paulo Bernardo, tais como: irregularidades na quebra de sigilos telefônicos, ilegalidade de algumas delações premiadas e a atuação da Polícia Federal (PF), que teria avançado em atribuições que são apenas do STF e da PGR.

Em maio, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, denunciou Gleisi e Bernardo ao STF, além do empresário Ernesto Kugler Rodriges. Eles teriam cometido corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Segundo as investigações da Lava-Jato, a campanha de Gleisi ao Senado em 2010 recebeu R$ 1 milhão do esquema de desvio de dinheiro da Petrobras. Há indícios de que o dinheiro foi entregue pelo doleiro Alberto Youssef. A quantia teria sido paga em quatro parcelas a Kugler, a pedido de Gleisi e do marido.

A suposta participação do casal na Lava-Jato surgiu nas delações premiadas de Youssef e do ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa. Em seguida, veio a delação do advogado Antônio Carlos Fioravante Pieruccini, que detalhou como o dinheiro foi repassado para a campanha da petista. Todos os investigados negam as acusações. O relator do caso é o ministro Teori Zavascki, que cuida dos processos da Lava-Jato no STF. A denúncia ainda será analisada por ele e pela Segunda Turma do tribunal. Caso aceita, será aberta uma ação penal e os investigados passam à condição de réus.

Após a denúncia, a defesa de Gleisi, Bernardo e Kugler apresentaram seus argumentos ao STF e fizeram alguns pedidos. Agora Ela Wiecko se manifestou pela rejeição dessas questões e reiterou o pedido para que o STF aceite a denúncia. A vice-procuradora defende, por exemplo, a legalidade das delações e ressalta que, mesmo elas sendo harmônicas entre si, houve a coleta de novas provas, como o registro de telefonemas dos acusados. Como o tribunal está de recesso, a análise da denúncia poderá ocorrer somente a partir de agosto, quando o STF voltará a trabalhar normalmente.

“A defesa alega serem nulos os depoimentos prestados no âmbito das colaborações premiadas porque inaceitável que o depoimento de um colaborador sirva para corroborar o depoimento de outro. Respeitosamente, não se vê mínima razoabilidade argumentativa na tese defensiva. Ora, não procede minimamente a tese da existência de uma suposta ‘corroboração cruzada de delações premiadas’. Ao contrário, o que se tem é nada mais do que a verificação de depoimentos harmônicos, circunstância que, embora fortaleça ainda mais os indícios iniciais, não dispensa a confirmação por outros elementos de prova, o que veio a ocorrer no presente caso”, escreveu Ela Wiecko.

Os argumentos de Gleisi e Paulo Bernardo são parecidos, o que leva Ela Wiecko a ironizar as semelhanças. A vice-procuradora-geral analisa primeiro a defesa da senadora, e só depois a do marido, quando diz que ele segue “a mesma linha, quando não ipsis litteris, da defesa de sua esposa”. Ela Wiecko rebate também o argumento de que a PF teria realizado ações não permitidas, dizendo que “as confusões técnicas ora traçadas transbordam o limite razoável da argumentação”. Ao tratar do ponto em que a defesa reclamou que foram denunciados apenas algumas pessoas, e não todos os envolvidos no caso, Ela Wiecko afirma que houve “novo e grave equívoco técnico”.

“O Ministério Público, por seu órgão titular das ações penais originárias da competência do Supremo Tribunal Federal, após acurada análise do material probatório disponível, não se convenceu de que outras pessoas, ao menos do que se deduz especificamente dos presentes autos, tenham atuado como coautores ou partícipes dos crimes imputados no âmbito desta demanda”, sustenta Ela Wiecko.

Ela Wiecko também se manifestou contra os pontos apresentados pela defesa de Kugler.

Em junho, Bernardo foi preso em decorrência de um processo que surgiu como desdobramento da Lava-Jato. Nesse caso, a investigação está na Justiça Federal de São Paulo. Há suspeita de fraudes de R$ 100 milhões em empréstimos consignados de servidores federais. O dinheiro teria sido desviado por meio de contrato entre a empresa Consist e o Ministério do Planejamento, pasta que já foi comandada por Paulo Bernardo. Poucos dias depois de ser preso, ele foi solto por decisão do ministro Dias Toffoli, do STF.