ZURIQUE ? Um verdadeiro tesouro em desenhos e fotografias do renomado escultor Alberto Giacometti está guardado em caixotes lacrados em um museu suíço há mais de dois anos por causa de uma batalha jurídica sobre sua propriedade legal.
Promotores suíços dizem que requeriram o confisco da coleção enquanto a corte francesa não chega a um veredicto. A fundação Alberto e Annette Giacometti, localizada em Paris, alega que os trabalhos foram roubados décadas atrás.
Nascido na Suíça, Giacometto, que morreu em 1966, é um dos escultores do século XX mais conhecidos. Sua obra “Pointing man” foi vendida pela casa de leilões Christie’s por US$ 141 milhões no ano passado, o maior valor já alcançado por uma escultura.
Mas o embróglio legal sobre um acervo relativamente obscuro de desenhos e fotografias tem acontecido de forma silenciosa, em escritórios de advocacia e corredores de museus, no que tribunais suíços chamam de “acusação contra desconhecidos”, da parte de autoridades francesas.
A fundação em Paris, que abriga 5 mil trabalhos de Giacometti, o maior acervo do mundo, não especificou a quem acusa de roubo. Sabine Longin, diretora de desenvolvimento na instituição, declarou a Reuters que falaria publicamente apenas depois que a batalha sobre a posse das obras estiver resolvida.
? Eles nos pediram para confiscar os desenhos e fotografias, o que já fizemos. Para que eles sejam devolvidos, é necessária outra solicitação da corte francesa ? disse Claudio Riedi, da promotoria da cidade suíça de Chur, onde se localiza o museu em posse dos desenhos e fotos.
A coleção inclui 16 desenhos do artista e 101 fotografias dele feitas por fotógrafos famosos, incluindo Man Ray, Henri Cartier-Bresson e Robert Doisneau, abarcando um período que vai dos anos 1920 a 1960.
Embora os documentos na Justiça suíça tenham sido muito editados ? o nome de Giacometti, por exemplo, não aparece em lugar algum ? a Reuters conseguiu reconstruir o caso ao conversar com pessoas que estão familiarizadas com os detalhes.
“GRANDE AMANTE DAS ARTES”
O acervo estava na posse de Giacometti quando ele morreu em Chur em 1966, mas pode ter mudado de mãos entre membros da família antes de ser encaminhada a um “grande amante das artes” na Suíça por volta de 1998, de acordo com documentos da corte suíça.
Ao saber da existência da coleção em 2009, o Museu de Arte Grisons, localizado em Chur, arregimentou Remo Stoffel, um magnata local do ramo imobiliário e mecenas, para comprá-la por mais de US$ 1 milhão. Ele então a emprestou à instituição por 15 anos.
Com a primeira exibição pública em 2011, entretanto, a fundação de Paris registrou uma denúncia, alegando que os trabalhos teriam sido “roubados de forma fraudulenta”, de acordo com os documentos suíços.
Desde a intervenção da polícia, em fevereiro de 2014, os trabalhos vêm sendo mantidos no depósito do museu. Dois meses atrás, a corte de segunda instância da Suíça rejeitou um pedido para que o acervo possa ser exposto enquanto se aguarda a decisão judicial.
Nesta segunda, Stoffel confirmou sua atuação como patrono do museu, mas não quis comentar o caso. O diretor do museu, Stephan Kunz, e seu antecessor, Beat Stutzer, que organizou o acordo com Stoffel para levar o acervo a Chur, também não quiseram comentar, citando as ações na Justiça.
Historiadores da arte dizem que a coleção proporciona um vislumbre sobre a vida de Giacometti e seus contemporâneos. Em uma foto de 1946, por exemplo, Bresson captura Giacometti e sua mulher descendo a escada para seu estúdio em Paris. Outra o mostra esculpindo em na vila suíça de Stampa em 1964, dois anos antes de morrer de pericardite e bronquite crônica.
Em um desenho feito praticamente de forma casual em uma página de revista, Giacometti oferece sua visão sobre um nu de Picasso na página oposta ? a arte imitando a arte.
? A coleção oferece uma documentação muito importante do artista e seu lado privado ? diz Katharina Ammann, uma especialista suíça que ajudou a produzir o catálogo das obras durante a exposição de 2011. ? Também é um acompanhamento perfeito para os poucos trabalhos de Giacometti que já fazem parte do acervo do museu Grisons.