BRASÍLIA – Em uma atuação conjunta, o Ministério Público Federal (MPF/DF) e a Defensoria Pública da União (DPU) enviaram à Justiça, na última quarta-feira (26), um pedido de liminar para garantir que o INSS respeite os direitos de segurados durante a revisão dos benefícios de aposentadorias por invalidez e auxílio-doença. Realizados com base na Medida Provisória 739/16 ? que perderá a validade no próximo dia 4, mas deverá ser substituída por um projeto de lei a ser enviado ao Congresso ? os processos de revisão devem atingir, nos próximos dois anos, cerca de 1,6 milhão de segurados, sendo 530 mil beneficiários de auxílio-doença e outros 1,1 milhão de aposentados por invalidez. Esse é o total de segurados que o instituto pretende convocar para que sejam submetidos a novas perícias.
?Ainda não há ação judicial acerca do tema, que segue sendo investigado na esfera extrajudicial. No entanto, diante da gravidade dos fatos e da necessidade urgente de solução, os responsáveis pela apuração optaram pelo pedido de tutela provisória de urgência, conforme prevê o Novo Código de Processo Civil (artigo 303)?, diz um comunicado divulgado nesta sexta-feira pela Procuradoria da República do Distrito Federal.
Na petição enviada ao Judiciário, a procuradora da República Eliana Pires Rocha e a defensora pública federal Fabiana Bandeira de Faria citam medidas que, segundo elas, precisam ser adotadas pela autarquia para que não ocorra a violação de direitos, sobretudo de pessoas hipossuficientes que, em sua maioria, não têm condições financeiras e nem conhecimento para se opor à atuação do poder público. A lista de providências solicitadas à Justiça inclui a observação do devido processo legal, tanto administrativo quanto judicial, a não realização de perícias médicas ? remuneradas por bonificação ?durante a jornada ordinária de trabalho dos profissionais, a garantia da presença de um acompanhante do segurado no exame pericial (quando solicitado) e a inclusão de uma estimativa de prazo mínimo para a cessação dos benefícios nos casos de auxílio-doença.
No documento, as autoras lembram que a possibilidade de revisão dos benefícios não é novidade. O mecanismo que tem o propósito de assegurar o poder-dever de fiscalização da autarquia previdenciária já estava previsto na Lei 8.123/91. O problema é que, na alteração da norma, via Medida Provisória, o governo não estabeleceu de forma clara como deverá ser o processo administrativo que instruirá eventuais cancelamentos de benefícios.
O assunto é objeto de um inquérito civil, instaurado no mês de agosto, na unidade do MPF, em Brasília. Na fase inicial da apuração, foram solicitadas informações ao INSS. Em resposta, o instituto apresentou conceitos previdenciários envolvidos no tema, os procedimentos já previstos para a revisão e a repercussão social dos efeitos que pretende alcançar com a medida. No entanto, permaneceram dúvidas acerca da aplicação das novas regras, o que fez com que fosse solicitada a tutela antecipada.
As autoras enfatizam que o direito ao contraditório e à ampla defesa em processos administrativos ? caso do instrumento que pode levar ao cancelamento dos benefícios previdenciários ? está previsto na Constituição Federal e que foi regulamentado pela Lei 9.784/99. Portanto, argumentam elas, a instituição previdenciária não pode cancelar um benefício antes de esgotar todas as instâncias administrativas ou, no mínimo, de intimar o beneficiário e franquear a ele ?de forma ampla e integral o contraditório?.
Nos casos em que os benefícios foram assegurados pela via judicial que ainda não têm decisão definitiva, o entendimento do MPF e da DPU é que o INSS tem o dever de informar à Justiça a nova situação, ou seja, a descoberta de que a condição que gerou a concessão do benefício não existe mais. Para isso, deve juntar cópias dos processos administrativos de revisão em todas as ações judiciais em curso.
Outro aspecto mencionado na petição é o fato de a MP 739 ter previsto a possibilidade de pagamento de um bônus especial de desempenho aos peritos que realizarem exames com o fim de viabilizar as revisões dos benefícios mantidos pela autarquia há mais de dois anos, sem que o beneficiado tenha sido submetido à revisão sobre suas condições laborais. De acordo com a norma, o profissional poderá receber um acréscimo de R$ 60 por perícia. Para o MPF, ?a inovação legislativa? parece ser condescendente com o déficit no atendimento, resultado de uma longa greve realizada pelos peritos entre 2015 e 2016. A estimativa é que, ao longo dos cinco meses que duraram o movimento, mais de 1,3 milhão de perícias deixaram de ser realizadas. Em relação a esse ponto, o pedido enviado à Justiça é para que essas revisões sujeitas ao recebimento de bônus só sejam realizadas durante jornada extraordinária.
?Para que o objetivo estatal seja atendido, impõe-se estimular o trabalho excepcional, quer para não tumultuar a jornada ordinária, quer para não reduzir a capacidade operacional ordinária em prejuízo a novos pedidos de agendamentos periciais e da boa técnica?, descreve um dos trechos do documento.
A petição também chama de irregularidade cometida pelo INSS nos atendimentos periciais a negativa de que o segurado esteja acompanhado durante a perícia. As autoras lembram que a medida não tem amparo legal, o que, inclusive, fere normas legais previstas no Estatuto da Pessoa com Deficiência, do Idoso e da Criança e do Adolescente. Para a procuradora da República e a defensora pública Federal, a conduta dos médicos peritos constitui abuso de autoridade de agente público, ?já que se acha desprovida de qualquer justificativa legal que se sobreponha aos direitos dos segurados doentes e inválidos?. Nesse caso, a solicitação judicial é para que o instituto se abstenha de fazer a proibição de acompanhamento quando a medida for solicitada pelo beneficiário.
Na avaliação das autoras do documento enviado à Justiça, é preciso assegurar que os profissionais responsáveis pelas concessões dos benefícios apresentem um prazo mínimo pela qual vão pautar a concessão dos auxílio-doença. Para isso, MPF e DPU pediram que a Justiça imponha ao INSS a obrigação de elaborar uma tabela das 20 doenças que mais dão causa a pedidos de auxílio-doença e, para cada uma, apresente uma estimativa temporal mínima para a recuperação do beneficiado. Com isso, se pretende estabelecer critérios mínimos de igualdade na concessão do benefício, garantindo segurança jurídica, transparência e controle social da ação administrativa. Como a revisão está acontecendo nas agências do INSS de todo o país, as autoras pedem que a decisão judicial tem validade em todo o território nacional.