CARACAS ? Nicolás Maduro recorreu novamente ao modelo cubano para criar os alicerces de um sistema de Inteligência popular que lute contra ?a bandidagem, o paramilitarismo, o terrorismo e a ultradireita (oposição)?, numa adaptação moderna dos famosos Comitês de Defesa da Revolução.
?Devemos fortalecer a capacidade de Inteligência, e como quem mais sabe de tudo por aqui é o povo, usamos os conselhos comunitários, os Clap (comitês locais de distribuição de alimentos, também criados como uma versão atualizada das cadernetas de racionamento cubanas) e os Congressos da Pátria?, exigiu o presidente na última quarta-feira em seu pronunciamento às Forças Armadas, no qual afirmou que a medida é necessária para evitar manifestações de revolta como a que resultou no incêndio de uma prefeitura há duas semanas.
O presidente anunciou sua decisão no mesmo dia em que foram revelados os aterradores números da insegurança no país (28.479 homicídios em 2016, o equivalente a uma morte violenta a cada 18 minutos, segundo o Observatório Venezuelano da Violência) que o chavismo tradicionalmente atribui ao capitalismo.
O ?filho de Chávez? não quer apenas emular os irmãos Castro, mas também espera, com essa decisão, manter o controle absoluto da Inteligência, que ainda não está 100% nas suas mãos. O Serviço de Inteligência Bolivariana (Sebin) é comandado por um dos homens de confiança de Diosdado Cabello, o chefe militar da revolução.
? A ativação da Inteligência popular em 2017 para tarefas de vigilância, segurança e controle social aprofundará a discriminação política e será usada para criminalizar opositores e dissidentes ? alerta Rocío San Miguel, presidente da ONG Controle Cidadão.
De fato, desde os protestos de 2014, o chavismo tem usado informações dos chamados ?cooperadores patriotas? nas acusações contra presos políticos, amparadas por seu anonimato.
?São mecanismos fascistas de monitoramento sistemático dos cidadãos no qual somos todos suspeitos?, queixou-se Laurens Pernía, colunista do site ?Aporrea?, crítico ao chavismo.
Na verdade, como reconhece o próprio Pernía, não se trata de uma nova iniciativa do chavismo. Ainda em 2014, o próprio Maduro, apoiando-se na Lei Habilitante, criou o Sistema de Proteção Popular para a Paz (SP3), uma tentativa fracassada de integrar toda a informação do Estado. Há dois anos, o chefe de Estado propôs a incorporação da polêmica milícia que ? de acordo com números coletados junto ao governo ? é formada por 379 mil milicianos. Na prática, eles participam de todas as marchas governamentais, vigiam alguns hospitais e fazem a segurança do Quartel da Montanha, onde estão os restos mortais de Chávez.
As milícias voltarão a ser um eixo fundamental nos exercícios militares convocados por Maduro para o dia 14 de janeiro, e batizados em homenagem ao lutador popular Ezequiel Zamora.
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