Cotidiano

Livro mostra como bandas de rock podem inspirar negócios

20151222_daniel_e_marco_0131 (1) (1).jpg Rock RIO – Se uma banda de rock fosse uma empresa, os técnicos e os músicos contratados seriam os funcionários e os fãs, os clientes. E as semelhanças não terminam aí. Para conquistar uma plateia, é preciso muito mais do que soltar a voz e detonar nos metais. Como qualquer boa companhia, é preciso inovação e planejamento. Pensando neste paralelo, a dupla de jornalistas Daniel Fernandes e Marco Bezzi saiu atrás de histórias por trás de estrelas da música e lançou o livro ?Como o rock pode ajudar você a empreender?, cheio de bastidores e dicas para quem busca o sucesso nos negócios.

O GLOBO – Como surgiu a ideia do livro?

Daniel – Fui ao show do Bruce Springsteen em São Paulo, durante a semana, no Espaço das Américas, e ele só foi à cidade porque havia sido contratado para fechar uma das noites do Rock in Rio. O fato é que o cara, acostumado a tocar para 60 mil pessoas, tocou para quatro mil ? havia muito espaço vazio. Fiquei com isso na cabeça, e escrevi uma resenha do show sob a ótica do empreendedorismo, sobre como um cara consegue manter a motivação, mesmo diante de poucas pessoas. Comecei a investigar a trajetória dele e notei algumas semelhanças com a condução da empresa, exceto pelo fato de que ele tinha paixão e originalidade, coisas que faltam para muitos negócios. Achei que isso poderia se transformar em livro. Algum tempo depois, o Bezzi, com quem já havia trabalhado, me procurou porque tinha uma ideia: queria escrever um livro que unisse rock com empreendedorismo.

Marco – Começamos a perceber que grandes bandas e artistas funcionavam porque tinham em seu DNA o empreendedorismo como mola propulsora, conscientemente ou não. Cubro música e entretenimento há 15 anos e os laços cada vez se estreitavam mais na minha cabeça. A carreira de um músico se estabelece frequentemente em cima de modelos e conceitos que startups utilizam cientificamente, mas que, muitas vezes, na cabeça do artista, surge empiricamente. Arte e negócios sempre surgiram como assuntos antagônicos. Mas, se bem equilibrados, podem ressaltar tanto um artista como uma empresa.

O que uma empresa e uma grande banda de rock têm em comum?

Daniel – O principal ponto é que ambas têm o desafio de oferecer ao público uma experiência única. Num mundo em que tudo é cada vez mais rápido, fácil e, muitas vezes, sem sentido, oferecer experiências é algo que pode transformar um cliente em fã. Outro ponto é a necessidade de inovar a todo momento. A indústria da música passou por uma transformação gigantesca na última década, precisou se reinventar e adotou um modelo de negócio completamente diferente. O empreendedor que não inovar certamente vai morrer. Esses, para mim, são os dois pontos fundamentais. Mas, no livro, vamos extraindo da trajetória de bandas e músicos pontos específicos, como ter um sócio, momento em que exploramos a história do Guns, e crescer ou ficar pequeno, quando falamos do Dead Fish.

Marco – Conversamos com músicos, como Dinho Ouro Preto, Dado Villa Lobos e Rodrigo Lima, do Dead Fish, que se assustavam sobre como em determinadas passagens de suas carreiras, quando tomaram decisões basicamente empreendedoras para seguirem em frente. Na nossa cabeça, sem extrapolar as barreiras da arte, uma banda é uma empresa que tem seus funcionários (músicos contratados e técnicos) e seus consumidores (fãs).

como o rock pode ajudar voce a empreender.jpgO que a trajetória delas ensina aos empreendedores?

Daniel – Quando você olha a história do Guns N? Roses, e de todas as brigas que levaram ao fim da banda, que anunciou recentemente uma volta, vemos que foi a incapacidade de lidar um com o outro – Axl Rose e Slash – que terminou com um dos grupos mais importantes da história do rock. E isso acontece muito mais do que deveria, com empresas em que há sócios. Trata-se de entender as expectativas do outro, de saber ceder e negociar e, principalmente, de deixar o ego do lado de fora. É exatamente o contrário do Pearl Jam, por exemplo. Não abordamos a história deles no livro, mas eles souberam passar pelo turbilhão do Grunge, foram catapultados ao estrelato e souberam construir um caminho longo e duradouro.

Há episódios pouco conhecidos do grande público no livro?

Daniel – Acho que a trajetória do Dead Fish, uma banda que estourou, e entendeu que a essência do seu trabalho estava em ser pequena, em permanecer à margem do mainstream, é o caso mais interessante do ponto de vista da indústria da música, e como ela pode ser cruel em alguns casos, e na ótica do empreendedorismo. Existe uma discussão muito grande e que atinge a todos nós, inclusive os empreendedores. Vale a pena crescer a todo custo? Acho que o empreendedor precisa a todo custo entender qual é o seu tamanho ideal e, a partir disso, construir a sua identidade.

Para vocês, qual é o maior case de sucesso do rock?

Daniel – O Bruce Springsteen. É um sujeito que começou do nada em Nova Jersey e se tornou um dos artistas mais conhecidos em todo mundo. Ele sempre teve em mente que tinha talento, que havia nascido para aquilo. Mas nunca se eximiu de trabalhar duro, de construir o seu sonho a partir do trabalho. Além de saber unir o talento natural para a música com o trabalho duro, ele soube gerenciar a carreira ? montou uma banda espetacular, a E-Street Band, que lhe deu possibilidade de ir além. Além disso, ele procura transformar cada show em uma experiência única. Lembra quando ele abriu o show do Rock in Rio cantando, em português, a música ?Sociedade alternativa?, do Raul Seixas? Não é simplesmente vender uma imagem de legal, mas se esforçar para atender àquele público específico.

Marco – Além do Bruce Springsteen, o artista que talvez melhor traga o selo empreendedor na testa foi David Bowie. Ele mostrou, em cada álbum e movimento que lançou, como estar sempre conectado com seu ambiente, como transformar cada oportunidade em algo ativo para sua ?empresa?. Quando lançou ?Space Oddity”, simplesmente se conectou à chegada do homem à Lua, trazendo inspiração de ?2001, uma odisséia no Espaço”, do Kubrick. Uniu arte, cotidiano e, principalmente o consumidor, ou o fã, se preferir. Bowie ensinou a ter a coragem de experimentar, a olhar para o diferente sem preconceitos. Ele não era um porra louca que fazia o que desse na cabeça. Tinha uma estratégia bem definida para cada álbum, personagem e momento de sua carreira. Sabia como manchetar um jornal. E soube fazer isso até o fim, quando lançou em vida um álbum póstumo.