RIO – Nas décadas de 1950 e 1960, enquanto a Zona Sul vivia a ebulição da bossa nova, os jovens considerados transgressores, mais adeptos dos solos de guitarra do que do banquinho com violão, pegavam as suas lambretas e, devidamente trajados com as suas jaquetas de couro, rumavam para o Méier. Lá, em frente ao então Cine Imperator, se reuniam para ouvir os novos sucessos do rock?n?roll. Passados mais de 60 anos, uma peregrinação semelhante vem ocorrendo toda primeira quinta-feira do mês, desde julho de 2014, com o início do ?Rio novo rock?, que leva bandas independentes para o palco da casa, transformada pela prefeitura num centro cultural depois de 15 anos fechada.
O projeto foi idealizado pelo gerente do Imperator, Paulo Lopez, morador de Santa Teresa e um entusiasta do gênero.
? Como centro cultural, o Imperator deve formar plateias, promover e valorizar a cultura carioca. Essas eram justamente as lacunas que a cena independente do rock da cidade passava naquele momento ? explica.
A primeira edição, em julho de 2014, teve como atrações as bandas Drenna e Tipo Uísque, com um bom público. Já a segunda, com o evento circulando nas redes sociais e no boca a boca dos adeptos do gênero, atraiu 700 pessoas para os shows dos grupos Medulla e Canto Cego.
? O Rio tem uma história muito forte com o rock. A primeira música do gênero no país foi gravada aqui pelo Cauby Peixoto, ?Rock and roll em Copacabana?. Fora isso, as grandes bandas dos anos 1980 vieram morar na cidade. Temos também o Rock in Rio e o Circo Voador ? argumenta Lopez, ressaltando que pelo próprio palco do Imperator já passaram nomes consagrados, como Ramones, Pantera e Megadeth.
Um dos focos do Rio novo rock é a valorização da música autoral, que deve ser, em média , 95% do repertório das bandas que se apresentam por lá, segundo Lopez.
? Quando se fala em formação de plateia, é essencial apostar também na música autoral para que os artistas possam renovar a cena. Dificilmente eles teriam possibilidade de apresentar esse repertório numa casa com uma estrutura tão boa quanto a do Imperator ? ressalta.
Para ele, a aposta no segmento se torna ainda mais importante num momento em que há um desequilíbrio e uma mentalidade equivocada no mercado musical.
? Há quem pense que um gênero precisa acabar para que outro apareça. Não é assim, tem espaço para todos. Mas, de fato há um desequilíbrio no espaço dado para cada um. Os empresários precisam se dar conta de que esse mercado só vai se manter se novos artista forem revelados ? opina.
TRATAMENTO DE GRANDES ESTRELAS
O tratamento dado às bandas independentes é o mesmo dos artistas consagrados que passam pela casa. Este é um dos motivos que tem transformado o Imperator numa espécie de batismo para qualquer grupo da cena.
? O que temos percebido é que os próprios artistas passam a acreditar mais no próprio potencial depois que passam por aqui. Nos responsabilizamos pelo transporte do grupo, fazemos uma divulgação forte e, antes do show, uma boa passagem do som, sem correria. Deixamos tudo pronto para que eles possam fazer um show impecável ? diz Lopez.
Os hits do gênero também não ficam fora da noite. Eles estão nos sets dos DJ convidado a cada edição. Muitos deles, são oriundos de grandes festas da Zona Sul.
Outra aposta do projeto é trazer artistas de outros estados, que levarão o nome da cena carioca para o restante do Brasil e, consequentemente, chamarão artistas daqui para tocar em suas cidades. Entre os nomes que já tocaram estão os grupos Dona Cislene (DF), The Baggios (SE) e Versalle (RO).
Para ele, em quase dois anos de existência, o ?Rio novo rock? contribuiu de forma significativa para a cena, mas não está sozinho. Faz parte de um movimento crescente, que vem surgindo em diversos bairros por meio de coletivos e de uma forma democrática, como o ?Roquealize-se?, feito na Praça XV de Novembro, em Marechal Hermes.
Ao olhar para o futuro, Lopez diz que sonha em fazer edições do projeto na Zona Sul e transformá-lo num grande festival independente, visto e desejado no país todo.
? Temos grandes festivais independentes no país, mas eles estão fora do eixo Rio-São Paulo. É importante que tenhamos algo por aqui, porque o que vemos é que grandes artistas, que hoje estão tocando nos EUA e na Europa, surgiram destes lugares com festivais ? conclui o gerente do Imperator.