SÃO PAULO – Após denúncia de que a Guarda Civil Metropolitana (GCM) recolhe pertences pessoais de moradores de rua de São Paulo, incluindo colchões e cobertores para que eles se protejam de um frio que já chegou a zero grau, o prefeito da cidade Fernando Haddad (PT) pediu que seja feito procedimento administrativo para apurar a ação da GCM. A denúncia foi feita pelo padre Júlio Lancellotti, coordenador da Pastoral de Rua de São Paulo. Segundo o religioso, cinco moradores de rua morreram nos últimos dias em consequência do frio.
– Tudo que for de uso pessoal dele é proibido… Tanto a integridade física dele quanto de uso pessoal dele, é proibido recolher. O que é recolhido é material de cafofo. O material dele: lençol, coberta, documentação, vestuário, nada disso pode ser tocado. E o comandante da guarda está bem instruído. Eu falo todo dia com ele sobre o assunto. Recebeu denúncia, abre procedimento disciplinar – afirmou ele, referindo-se ao comandante da GCM, Gilson de Menezes.
De acordo com Haddad, a orientação é que não se monte habitação, “com sofás e armários”, em praças.
– Qual a orientação? Não deixar favelizar as praças públicas. É só essa a orientação. E o que é favelizar? É aquilo que acontecia no Largo São Francisco. Aquilo que acontecia na região da Luz. Na Praça da Sé. Nós fizemos a desfavelização em sete praças públicas da cidade de São Paulo. Sem nenhum higienismo. Todo mundo que estava na praça foi acolhido pelos equipamentos da Prefeitura. E o que estamos tentando impedir é refavelização.
Lancellotti afirma que até remédios utilizados por moradores de rua são recolhidos por agentes. Segundo ele, a população chega a ser revistada.
– Eles levam de roupas, recolhem as coisas dos moradores de rua, de documentos a remédios. Já conseguimos recuperar duas carroças. Em que uma carroça prejudica a cidade? – questiona Lancellotti.
Em nota, o comandante da GCM, Gilson de Menezes, explicou que os guardas apenas “prestam apoio de segurança aos servidores das 32 subprefeituras no trabalho de reorganização urbana”. O texto informa ainda que o objetivo é “retirar materiais inservíveis em calçadas e ruas da capital paulista e impedem o fluxo de pedestres e veículos”. Na nota, Menezes ressalta que “para preservar essas pessoas no clima mais frio, que não sejam retirados cobertores ou lençóis que estão nas ruas”.
PREFEITURA DIZ QUE SOBRAM VAGAS EM ABRIGOS
Por conta da baixa temperatura, a prefeitura de São Paulo informou, em nota, que criou mais 200 vagas de acolhimento na última noite e que, desde o início do programa Operação Baixas Temperaturas, em 16 de maio, além das 10 mil vagas fixas, o serviço foi ampliado em mais 1.517 vagas emergenciais, totalizando 11.517 espaços.
Segundo pesquisa da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe) realizada em 2015, 15.905 pessoas vivem em situação de rua na cidade. A assessoria de imprensa da prefeitura afirmou ao GLOBO que haveria a possibilidade de criação de novas vagas se todos resolvessem sair das ruas, mas que hoje há até locais disponíveis. Na madrugada desta terça, segundo o órgão, foram registrados 10.935 acolhimentos na rede socioassistencial.
Lancellotti afirma que ainda que haja vagas para todos, muitos se recusam a ir para os abrigos porque eles se consideram apenas números.
– Se não aceitam ficar no abrigo, quem tem que mudar? A prefeitura tem que sentar com os acolhidos. São muitas regras. Querem que eles entrem nesses espaços mudos e saiam calados. Se um deles passa mal, não perguntam se estão bem. Há albergues onde as pessoas são chamadas por números. E é isso que eles são para a prefeitura – opina.
– A irmã do Adilson Justino (encontrado morto no último domingo, na Avenida Paulista) soube de sua morte pela televisão, ao ver sua imagem numa reportagem. Como não a localizaram antes? Eles não ligam para a história dessas pessoas – acusa.
Nesta terça-feira, São Paulo registrou o sexto dia consecutivo com temperaturas menores que 10 graus, segundo o Instituto Nacional de Meteorologia. A temperatura mínima registrada foi de 7,0°C no Mirante de Santana, zona norte da cidade. A temperatura mínima da madrugada desta terça-feira no estado foi de -1,8°C em Campos do Jordão com geada forte.
Para esta quarta-feira, a previsão é de mínima de 8°C, na região central. Nas áreas periféricas de menor urbanização, lembra o Inmet, a mínima extrema será cerca de 4°C. Em comparação ao ano passado, destaca-se que não houve temperatura abaixo de 10°C no Mirante de Santana em 2015.