BRASÍLIA – O governo federal vai reservar R$ 5 milhões por ano para garantir que pelo menos uma aeronave da Força Aérea Brasileira (FAB) atue exclusivamente no transporte de órgãos destinados ao transplante. O Ministério da Saúde e a FAB assinam nesta quarta-feira um termo que permitirá o uso do dinheiro a partir do orçamento da pasta, e não do Ministério da Defesa.
Em 6 de junho, o presidente interino Michel Temer editou um decreto que obriga a disponibilidade de pelo menos um avião da Aeronáutica para o transporte de órgãos. O decreto foi uma resposta à reportagem do GLOBO que revelou, no dia anterior, que a FAB recusou transportar 153 corações, fígados, pulmões, pâncreas, rins e ossos entre 2013 e 2015.
O ministro da Saúde, Ricardo Barros, e o brigadeiro Raul Botelho, chefe da Aeronáutica, assinam nesta quarta um termo de execução descentralizado (TED) com vigência até 2019, podendo ser renovado se assim as partes desejarem. Esse tipo de parceria permite que se usem créditos orçamentários entre os ministérios envolvidos. Na prática, conforme o Ministério da Saúde, haverá uma reserva de R$ 5 milhões por ano para garantir o cumprimento do que prevê o decreto presidencial.
Desde a edição do decreto, há quase três meses, 47 órgãos já foram transportados pela FAB, com destino ao transplante, principalmente corações e fígados. O tempo de isquemia do coração ? o tempo em que o órgão pode ficar sem irrigação sanguínea ? é de apenas quatro horas. Para se ter uma ideia, a quantidade de órgãos já transportada nestes 85 dias é o dobro da transportada pela FAB ao longo dos 365 dias de 2015.
O GLOBO publicou uma série de reportagens em junho revelando o problema e a dimensão das recusas da FAB. Nos mesmos dias em que a Aeronáutica deixou de fazer os transportes dos órgãos, a instituição atendeu a 716 requisições de transporte de ministros do Executivo e de presidentes do Supremo Tribunal Federal (STF), do Senado e da Câmara.
O transporte de órgãos era previsto apenas em um termo de cooperação, que não obrigava o deslocamento por parte da FAB. Já o transporte de autoridades é uma obrigação prevista em lei ? um decreto válido desde 2001. Com o novo decreto, a FAB passou a ter a obrigação de fazer o transporte de órgãos ou até mesmo de pacientes e familiares até o local onde um órgão é ofertado.
A série mostrou ainda que fatores logísticos, para além da falta de aviões nas rotas interestaduais, levaram o sistema de transplantes a deixar de aproveitar 982 órgãos em cinco anos, entre 2011 e 2015. Segundo o Ministério da Saúde, o TED servirá para “oficializar” a parceria com a FAB prevista no decreto de 6 de junho.