Cotidiano

Dia dos Namorados deve ser mais uma data marcada por lembrancinhas

RIO – Às vésperas do Dia dos Namorados, o comércio brasileiro se prepara para mais uma data comemorativa de queda. A Pesquisa Nacional sobre a Intenção de Compra da Fecomércio RJ/Ipsos, que ouviu 1,2 mil consumidores em 72 municípios, estima um decréscimo de cinco pontos percentuais nos clientes em potencial em relação ao ano passado – 29% da população pretende presentear alguém em 2016, o equivalente a 45 milhões de consumidores. No entanto, se o levantamento espera a movimentação de R$ 6,3 bilhões em comemorações da data, a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) é menos otimista: prevê que rodem pelo comércio R$ 1,8 bilhão, com base em dados do IBGE. O economista da CNC Fabio Bentes explica que o valor parece alto aos olhos leigos, mas que o mercado de varejo deve amargar “uma queda em cima de uma queda”.

— Nós projetamos uma queda de 8,5% em relação a 2015, que já caído 1,1% ante o ano anterior. Vimos picos em 2008, 2010 e 2011, mas de 2012 em diante vimos que o varejo perdeu força, e não só no Dia dos Namorados. A lembrancinha vai estar em moda por causa da crise — explica Bentes.

Christian Travassos, economista da Fecomércio, ressalta a importância das datas comemorativas em momentos de retração da economia, por estimular o consumo não só de presente, como de lazer, alimentação fora de casa e viagens. Com o acréscimo nas vendas, ele diz, há mais encomendas, o que aquece a indústria e favorece também a arrecadação de impostos. Apesar da “baixa confiança do brasileiro”, a pesquisa da Fecomércio/Ipsos constatou um aumento no valor médio que o brasileiro planeja gastar entre presentes e comemorações: subiu de R$ 121,13, em 2015, para R$ 142,43 este ano.

— O ticket médio subiu porque temos uma diminuição do número de pessoas que vão comprar presente ou comemorar este 12 de junho. Na pesquisa, o entrevistado fala um valor mais alto porque já contabilizou a sensação de inflação sobre o que pretende gastar. Além disso, o consumo está mais espaçado, mais seletivo, então o consumidor pode se dar ao luxo pontualmente — analisa Travassos.

Até mesmo o carro-chefe do varejo, o vestuário, que corresponde a R$ 77 a cada R$ 100 gastos, deve ir mal este ano. A projeção da CNC é de queda de 8,7% para o segmento — retração superior à média porque “ainda está em ação tudo o que empurra o varejo para o pior ano da série histórica do IBGE”, iniciada há 15 anos, ressalta Bentes. Mesmo assim, de acordo com a pesquisa Fecomércio/Ipsos, as roupas devem representar 30% dos presentes neste 12 de junho.

Em meio à retração do comércio, a Fecomércio/Ipsos destaca a alta prevista de 13% para o setor de calçados, bolsas e acessórios este ano – acréscimo de oito pontos percentuais em relação ao ano passado. Um segmento, diz o economista da CNC, que envolve uma classe mais alta, menos exposta aos efeitos da crise.

— O país está mais pobre, mas há desigualdade de renda. Esses produtos têm um público de maior poder aquisitivo, que não tem tido a mesma dificuldade de fechar as contas. O mercado premium vai ser atendido. Mas aposto que a alta deve ser menor que de anos anteriores e nem de longe vai ajudar o varejo a evitar um resultado tão ruim — comenta o economista, que projeta uma queda de 0,6% para o setor no ano.

NA LINHA DE FRENTE, A CAUTELA

Segundo Bentes, a cautela deve ser a palavra de ordem entre os consumidores da classe média nesta data comemorativa. Como há retração do emprego e da renda, inflação acima de 9% e um crédito que não se via tão caro desde 2011 – juros em 70,8% ao ano, o mais alto da série histórica — o recurso disponível para o consumo está em baixa. Quem costumava procurar presente em shopping, diz, este ano vai ao Saara, ao Mercado de Madureira para economizar.

— Em momento de aperto, o consumidor não tem ativo para gastar. O celular, por exemplo, que os jovens adoram dar de presente nesta data, dificilmente alguém paga à vista. Mas as pessoas estão com receio de assumir prestações com o emprego em risco. Ninguém vai querer se complicar nem que o parceiro se complique. A cautela vai ser um item de sobrevivência, até porque depois tem Dia dos Pais, Dia das Crianças — frisa o economista.

É possível que casais passem em branco no Dia dos Namorados. Isso porque o 12 de junho divide com a Páscoa o quinto lugar entre as datas comemorativas que mais movimentam a economia brasileira. Por isso, explica Bentes, a comemoração costuma sofrer em tempos de crise. O varejo já se prepara para se afinar à realidade de 2016, segundo o economista: deve mudar o mix das lojas de marcas importadas para produtos mais populares e repensar o fornecedor, negociar melhor com a indústria nacional e investir em liquidação, algo no que o varejo “se viciou com a crise”.

(*Estagiária sob supervisão de Andrea Freitas)