Às vezes sou acusada de não dar muita atenção aos pedidos de meus filhos. Quem diz isso? Uma chance, tente acertar. Não, não é meu marido. Pois é, sogra tem disso, passada a sua vez de ser mãe a realidade das outras é vista de forma meio enviesada. Tem sogra que esquece o tempo em que teve de educar crianças e tem aquelas que dizem em nada ter contribuído para o fato de todos os filhos ainda morarem no mesmo bairro em que nasceram, mesmo estando na casa dos 40 anos, aproximação que se deve mais pela necessidade de estar perto dos cuidados maternos do que por livre escolha, uma situação que nós, mães da era digital, não temos mais condições de perpetuar.
A princípio, espera-se que uma mãe facilite o dia a dia de seu filho. Mas a vida é dura, duríssima, e por isso pode parecer que não dou atenção àquilo que os meninos solicitam. Ao contrário disso, peço para que eles mesmos coloquem a roupa suja dentro da máquina de lavar, passem sabonete nas cuecas e levem até a cozinha os pratos e talheres que usaram. E mais recentemente, a última proeza: os garotos, com linha e agulha na mão, ensaiaram a pregar o primeiro botão de suas vidas. É claro que, passada a novidade, eu escuto: "mãe faz pra mim?”. Mas não, não faço. Você sabe fazer. Aliás, você precisa fazer.
No Japão, crianças limpam as privadas de suas escolas sem se sentirem menosprezadas por conta disso porque manter um ambiente higienizado e organizado é arrumar a própria alma. Meus filhos precisam, penso eu, desde pequenos, aprenderem a se virar sozinhos. No futuro, eles não vão encontrar companheiras serviçais – talvez, quem sabe, na Tailândia – e sabe-se lá até se vão querer se casar. Podem morar sozinhos, ir para outro continente, Europa, por exemplo, lugar onde contratar uma pessoa para as lides domésticas custa os olhos da cara.
Ficar em casa por muitos anos ao lado da mamãe pode resolver a questão. Roupa lavada, comida na mesa e botão sempre pregadinho, mas por quantos anos eu ainda terei essas habilidades, ou ainda, por quanto tempo viverei e terei condições de cuidar deles? E em pleno 2030 quem vai zelar por dois marmanjos barbudos que não sabem lavar as próprias cuecas?
Empurrar os filhos para fora do ninho é um ato de amor. Gostaria, e muito!, de deixá-los dormindo até o meio-dia e fazer de suas vidas um conto de fadas. Seria ótimo prolongar seus abraços apertados quando dizem que sou a melhor mãe do mundo, mas não dá, preciso abrir mão dos prazeres do reconhecimento imediato causado pelo conforto em nome da autonomia e da livre iniciativa. É psiquiatra e dor de cabeça a menos, alegria e independência a mais saber organizar sua vida e isso inclui pregar botão na camisa em qualquer emergência, asseio que terá sua necessidade triplicada quando a mamãe aqui já não estiver mais por perto.
Nesse dia, porém, saberei ter valido a pena escutar as críticas, ter dado um nó em meus dedos, aguentado o aperto no coração e passado cola nas solas dos meus pés, tudo que hoje escora a decisão de não sair correndo e atender a todas as vontades daqueles um metro e vinte de gente, meus pequenos homenzinhos que precisam estar prontos para subir ao palco e protagonizar o melhor papel de suas vidas.