SÃO PAULO – De 52 acordos de delação premiada firmados pela Lava-Jato nesses últimos dois anos, apenas 13 foram celebrados com pessoas presas no esquema do Petrolão. Ainda assim, Renan Calheiros, presidente do Senado, foi flagrado demonstrando interesse em acabar com tal prática, em conversa gravada com o ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado. Embora colaboradores sejam considerados pela força-tarefa da Lava-Jato o ponto de partida para as investigações do esquema de corrupção que envolve políticos e obras públicas, Renan defende mudança na legislação que envolve as colaborações de quem está atrás das grades.
O procurador da República Paulo Roberto Galvão, um dos integrantes da força-tarefa da Lava-Jato, não quis comentar o posicionamento do presidente do Senado. Ele afirmou que não é uma medida restritiva como a prisão que leva alguém a querer colaborar. Galvão afirma que, quando a Justiça começa a funcionar, há um impulso para o aumento no volume de colaboração.
Não é o medo da prisão preventiva, é o medo da Justiça. Se as pessoas sentem que têm real chance de serem condenadas, elas vão tentar evitar punição maior. E colaborar é um dos caminhos possíveis.
Os dois primeiros colaboradores da Operação Lava-Jato, o ex-diretor Paulo Roberto Costa e o doleiro Alberto Youssef, tiveram seus acordos assinados quando estavam presos. O primeiro foi Costa. O principal motivo que o levou à delação não foi a prisão ou o medo de sua condenação, mas a implicação de suas filhas e de seus genros nas investigações, conforme relato de defensores e familiares.
O medo de Youssef, por sua vez, foi o de receber uma condenação longa. O doleiro sabia que passaria muitos anos preso, já que a sua participação no esquema de corrupção da Petrobras levaria ao rompimento de uma delação feita por ele anteriormente no caso Banestado.
Na contrapartida, outras delações fundamentais às investigações foram feitas com réus em liberdade, como a do ex-gerente da Petrobras Pedro Barusco, que ampliou as investigações para mais de 200 obras. Ele procurou a Justiça assim que os primeiros empreiteiros foram presos, em 2014, da mesma forma que procedeu o empresário Augusto Mendonça. Há casos ainda em que o colaborador foi preso, conseguiu a liberdade e só depois recorreu à delação, como fez o presidente da UTC, Ricardo Pessoa.
REPERCUSSÃO NEGATIVA
As críticas às colaborações já causaram polêmicas também no governo do presidente interino Michel Temer. Além de Renan Calheiros, a repercussão negativa de uma posição contrária à delação atingiu o advogado Antônio Cláudio Mariz de Oliveira, que era cotado para ministro da Justiça. Seu nome foi descartado depois que ele deu uma entrevista crítica à investigação.
Existe sempre uma tentativa das defesas e de pessoas envolvidas de tentar limar os alicerces da Lava-Jato. E um dos grandes alicerces dessa investigação é a colaboração premiada. Há uma falsa transmissão da realidade. Apenas um quarto dos colaboradores que fizeram acordo estavam presos diz o procurador Paulo Roberto Galvão.
Tramitam no Congresso pelo menos oito projetos que afetam o uso da delação premiada, como o PL 4081/2015, que impede que alguém que tenha rompido um acordo anterior faça novo acordo. Neste caso, as confissões de Youssef não teriam acontecido. A principal mudança em tramitação é a apresentada pelo deputado Wadih Damous (PT-RJ), que impede que um réu preso assine acordo de delação, como defendeu o presidente do Senado nas gravações feitas por Sérgio Machado.
Em palestra na última quinta-feira, em Curitiba, o juiz Sérgio Moro afirmou que impedir que um réu preso faça delação premiada fere o direito de ampla defesa, pois a colaboração, na perspectiva do delator, é um meio de ele se defender. Para Moro, as tramitações desses projetos podem ser sinais de uma tentativa de retorno ao status quo da impunidade dos poderosos. Moro voltou a alertar sobre os riscos às conquistas alcançadas pela Lava-Jato até o momento, que podem ser destruídas por leis que facilitem a impunidade.