Toledo – As pessoas discordam em muitas coisas, mas existe um consenso sobre ser mulher e mãe. Uma condição sagrada, abençoada e permitida apenas para quem nasceu com o propósito de levar a vida adiante. Para elas, jovens ou idosas, a maternidade não é exclusiva da mãe que pariu, mas uma missão dada por Deus para toda a comunidade e sociedade. Juntas, elas parem, educam e amam os filhos de todas, contrariando o cenário solitário da maioria das famílias contemporâneas.
Na casa da terapeuta Selma Fernandes, cinco gerações se encontram. Da mais nova, ainda no colo, até a mais experiente, a hoje tataravó Dula, como gosta de ser chamada.
Animadas e muito falantes, elas se reúnem em círculos para se alimentar, conversar ou apenas para descansar uma no colo das outras. Acreditam que mulheres possuem a capacidade de curar mulheres muitas vezes apenas ouvindo as agonias uma das outras.
Descendentes de indígenas, inventaram uma aldeia moderna, onde a maternidade é cultuada desde a infância.
Elas enfrentam as mesmas jornadas das mães convencionais, mas na casa grande com mesa para mais de 20 pessoas, o tempo parece passar de forma tranquila e o som de várias gerações conversando na varanda traz à tona que a vida em família e o cuidado com o outro está na lista de prioridades absolutas.
A tataravó Dula conta sem nenhum problema de memória como pariu sozinha os 16 filhos. Lembra o nome, o rostinho e as travessuras de cada um. “Não tinha fraldas para os bebês nem varas para educar os filhos. Quando o pai olhava para eles já bastava para que o menino deixasse de fazer o errado. Eu vivi feliz, amada e agora vejo com muita alegria essa família linda e cheia de mulheres.
A bisavó é a Belinha e passou por dez gestações. Ela mostra que, apesar de viver em outro tempo, herdou da sua mãe a espontaneidade e o gosto por ver sua prole crescer no quintal do sitio em que movam juntas. “Teria tido mais filhos, mas o casamento não deu certo e a vida mudou muito. Quando eu estava gorda para ter os filhos, as mulheres da família chegavam todas em casa. Uma cuidava do frango que virava pirão, outra aquecia a água para o parto e alguma já ficava à disposição para lavar as roupas e ajudar no parto”, descreve, animada, interrompida pelas próprias gargalhadas.
Filha, mãe e avó: cura do sagrado feminino
Selma Fernandes é a avó mais recente, mas também é a neta mais velha da matriarca dessa família tão feminina. Tornou-se terapeuta naturalista, estudou o sagrado feminino e elevou a força da família. Hoje comanda a clínica Kahena, em Toledo, e cuida de milhares de mulheres. “Sabemos que temos um poder que ainda não foi reconhecido, mas que pode curar o mundo físico e o emocional. Assim como o leite materno cura doenças, a convivência com histórias e mãezinhas com tanto amor e vivência pode ser o bálsamo que o mundo precisa. No mundo da maternidade não existe espaço para o egoísmo, precisamos uma das outras para levar a vida e o amor adiante”, resume.
Selma defende que, quando uma das mulheres do grupo engravida, o resto perde a importância. Apenas o estado de graça importa. O mundo para e elas fazem uma espécie de “tenda emocional” para proteger a gestante de todos os conflitos e os desgastes. Ali, ela vai gestar a próxima geração da animada família entre risadas, festas e cuidados. Quando a criança nascer e já não depender exclusivamente da mãe, a vida vai recomeçando aos poucos.
A mãe mais jovem da “tribo” teve o filho há apenas 30 dias. Ela até tentou falar sobre a experiência, ela não conseguiu dizer uma palavra. É a primeira que chora, mas o sentimento de partilha é tão grande que logo as 14 mulheres que estão no local unem suas lágrimas e emoções com a jovem mamãe. O choro dura pouco, interrompido pela notícia de duas novas gestações na família e o clima volta a ser de proteção e festa.
A sexta geração já dá sinais de que a alegria e a união feminina pode ser o elixir de uma vida longa, maternal e muito feliz. Ser mulher e mãe nessa tribo é muito mais do que uma questão de gênero, mas de hora e bênçãos.