RIO?Apesar da grande influência que tiveram sobre o concretismo e o neoconcretismo brasileiros, nos anos 1950/60, as obras de Piet Mondrian (1872-1944) nunca haviam sido exibidas no Brasil. A exceção foi uma sala com peças do artista na representação holandesa da 2ª Bienal de São Paulo, em 1953.
? Estava mais do que na hora de apresentá-lo aqui ? defende Pieter Tjabbes, responsável pela curadoria da exposição ?Mondrian e o movimento De Stijl?, que chega ao CCBB nesta terça-feira, às 22h30m (o horário tardio se deve ao ?Viradão? de 24 horas de programação promovido pela instituição), depois de ter passado por São Paulo, Brasília e Belo Horizonte.
Tjabbes, também holandês, conseguiu o empréstimo de cerca de cem obras do Museu Municipal de Haia (Gemeentemuseum den Haag), que reúne a maior coleção do mundo de obras de Mondrian. Só dele, são 30 telas, o que permite traçar um percurso histórico e pictórico do artista. Se o nome Mondrian, no imaginário coletivo, está associado às telas de composição geométrica, formando retângulos brancos e de cores primárias delimitados por grossas linhas pretas, a sua trajetória até chegar ao que chamaria de neoplasticismo merece atenção especial.
? O interessante do Mondrian é que ele, quando começa a trabalhar com esse movimento, já é um artista de quase 50 anos ? explica Tjabbes. ? Começou como um pintor naturalista, bem nos moldes do século XIX, com algumas inovações, mas ainda muito pautado na arte tradicional.
O mais antigo quadro na mostra é ?Fábrica real de velas? (1895-1899), no qual já se vê a curva fora do padrão da pintura acadêmica: Mondrian não enquadra a imagem; como num recorte fotográfico casual, a mancha pictórica é cortada pelos limites da tela. Nela, já se vê, aponta o curador, as linhas verticais (das chaminés) e horizontais e seu interesse pelas formas.
? A tendência pelas composições é evidente desde o início. Ele quer que o olhar do espectador fique na superfície, sem a noção da perspectiva ? diz o curador, exemplificando com outra pintura dos primeiros anos, ?Celeiro em Nistelrode? (1904).
ARTE CONTRA INDIVIDUALISMO
A partir daí, as pinturas vão contando uma história, que passa pela influência dos pós-impressionistas de Paris ? caso de ?Farol em Westkapelle? (1908), em que Mondrian faz uso não realista das cores; do cubismo ? é exemplar ?Retrato de uma senhora? (1912); do pontilhismo (?Casa à luz do sol?, 1909), até chegar à decomposição abstrata da imagem e às formas geométricas ? ?Composição com grade 8; Tabuleiro de jogo de damas, cores escuras? de 1919, fecha o ciclo que desemboca nas composições que fizeram sua fama. Uma das salas no CCBB mostra essa progressão do figurativismo e a geometria abstrata, ocorrida em apenas sete anos.
Tão ligado estava o pintor a essa nova plástica que, ao receber em 1918 a encomenda de um colecionador de suas obras para que realizasse um autorretrato, portanto uma pintura figurativa, fez questão de marcar sua posição.
? Ele resolveu essa questão pintando um quadro abstrato seu como pano de fundo para o autorretrato. Assim se certificou de que ninguém o associaria a esse tipo de pintura que já havia abandonado. Desde o ano anterior já estava ligado ao movimento De Stijl ? conta o curador.
O movimento De Stijl nasceu em 1917 na Holanda, país que se manteve neutro enquanto a Europa vivia seu primeiro conflito armado continental.
? Enquanto os vizinhos guerreavam entre si, na Holanda conceitos extraordinários se associavam, com uma rede de conhecimentos se articulando em torno de uma revista: a ?De Stijl? ? diz Tjabbes.
A ?De Stijl? foi fundada em 1918, pelo artista e escritor Theo van Doesburg, e tornou-se um polo aglutinador de artistas, arquitetos, poetas e designers em torno da ideia de uma arte universal como antídoto contra o individualismo da época. Essa arte seria atingida por meio da pureza das cores primárias e da superfície plana das formas, conceito aplicado nas artes visuais mas também na arquitetura, na fotografia, no design, na literatura e tipografia.
Há exemplos de tudo isso na mostra do CCBB, cujo objetivo é mostrar como aquele movimento surgido há um século na Holanda cristalizou-se e ainda hoje exerce influência no design internacional. Por isso, mesmo que os nomes dos criadores não sejam facilmente reconhecidos pelo visitante, é imediata a comunicação de peças ícones, como a cadeira Vermelho Azul (1923) de Gerrit Rietvel, ainda hoje fabricada (a mostra traz uma das originais, com a pintura à mão). Também impressiona a modernidade da casa Rietveld Schröder (1924), da qual há maquete e plantas na exposição, e peças gráficas de nomes como El Lissitzky.
? O movimento De Stijl é muito otimista, utópico ? diz Tjabbes. ? Seus integrantes trazem uma forma de pensar o mundo que, imaginam, vai tornar esse mundo melhor. Nesse momento delicado do Brasil, é algo que passa a imagem de que, tendo ideias em comum, se consegue dar uma direção à sociedade.
?mondrian e o movimento de stijl?
Onde: CCBB ? Rua Primeiro de Março 66, Centro (3808-2020). Quando: Abre dia 11/10, às 22h30m. Qua. a seg., 9h às 21h. Até 9/1/2017. Quanto: Grátis. classificação: Livre.