SÃO PAULO. Em depoimento na sede da Polícia Federal (PF) em São Paulo, o pecuarista José Carlos Bumlai afirmou que sua ajuda nas obras do sítio de Atibaia foi pedida por Marisa Letícia, mulher do ex-presidente Lula, e encerrada com um telefonema de Aurélio Pimentel, segurança da primeira dama. Segundo ele, Pimentel lhe disse que dona Marisa estava irritada com a lentidão da obra e queria que os serviços fossem feitos por uma “construtora de verdade”.
Bumlai disse que o pedido para que ajudasse na obra do sítio partiu da própria Marisa e foi feito em 2010, conforme antecipou O GLOBO. Explicou que ela queria que as obras ficassem prontas rapidamente para que o sítio pudesse abrigar parte da mudança que o casal traria de Brasília para São Paulo, ao fim do mandato presidencial. Em relato à PF, ele disse que o serviço dos trabalhadores, que ele trouxe da Usina São Fernando, que pertence à família, não agradaram Marisa porque eles bebiam durante o trabalho e a obra não andava. Ele disse aos delegados que não foi informado sobre quem tocaria a reforma.
O depoimento durou menos de uma hora e, ao deixar a sede da Polícia Federal em São Paulo, Bumlai se mostrou cansado e abatido. Por determinação do juiz Sérgio Moro ele deve retornar à prisão dia 23, depois de cinco meses em prisão domiciliar devido ao tratamento de um câncer na bexiga. A defesa tenta reverter a decisão, pois argumenta que ele tem colaborado com a Justiça e cumpre prisão domiciliar com tornozeleira eletrônica, sem qualquer incidente.
Segundo as investigações, a obra de ampliação da casa e reforma da piscina foi feita por funcionários da Odebrecht, que chegaram a trabalhar uniformizados. Também a OAS se encarregou de parte dos serviços, como a contenção da represa e a reforma da cozinha, que tinha infiltrações, instalando também móveis planejados. Em depoimento de delação premiada, o ex-presidente da OAS, Léo Pinheiro, também, deve confirmar que fez os serviços pela amizade que tinha com o ex-presidente. Os serviços da OAS foram feitos depois que Lula havia deixado a Presidência.
Em março passado, o segurança Aurélio Pimentel foi ouvido pela PF na Operação Alethea. Contou que conhecia Lula desde 1989 e trabalhou como segurança pessoal nas campanhas eleitorais. Quando Lula chegou ao Planalto, ele deixou o almoxarifado da Prefeitura de Mauá, na Grande São Paulo, e foi nomeado assessor especial da Presidência da República, trabalhando diretamente no gabinete da primeira dama Marisa Letícia.
Pimentel contou, também no depoimento, que dona Marisa lhe pediu para acompanhar as obras do sítio, onde seriam guardados presentes que Lula recebeu durante os dois mandatos. Assim como Bumlai, o segurança também afirmou que soube apenas que o sítio pertencia a Fernando Bittar, amigo da família.
Recibos relativos a gastos na obra do sítio foram apreendidos pela Polícia Federal do apartamento do ex-presidente Lula, em São Bernardo do Campo, num total de R$ 66 mil. Também foi apreendida a nota fiscal da compra de uma porta de madeira de correr, que foi entregue em Atibaia. Parte dos recibos estavam em nome de Igenes Irigaray Neto, o arquiteto da empresa Fernandes dos Anjos que trabalhou no sítio.
Para a Polícia Federal, Bumla disse que acabou pagando cerca de R$ 38 mil do próprio bolso na reforma do sítio. O pagamento foi feito pela Usina São Fernando, que pertence a seus filhos, e já usava os serviços da Fernandes dos Anjos. A usina teria sido compensada com a entrega de cana de açúcar se suas fazendas.
Marisa Letícia não compareceu para depor na Polícia Federal sobre o sítio na última terça-feira. Os advogados reuniram a imprensa para explicar que ela nada mais fez do que exercer um direito garantido por lei, de não falar num inquérito onde o investigado é marido dela. A PF investiga se o ex-presidente Lula é o real proprietário do sítio, cujos donos que constam no cartório de registro de imóveis são Fernando Bittar e Jonas Leite Suassuna Filho.
Cristiano Zanin afirmou que dona Marisa já sofreu constrangimentos ilegais e foi humilhada com a divulgação, pela Lava-Jato, de escutas telefônicas que não tinham qualquer vínculo com a investigação. A ex-primeira dama foi flagrada falandro palavrão numa conversa com o filho, ao comentar sobre os protestos pelo impeachment da presidente Dilma Rousseff.
Os advogados afirmam que a manutenção do inquérito é uma arbitrariedade e que a investigação já deveria ter sido encerrada, pois Jonas Suassuna e Fernando Bittar já teriam entregue comprovantes da compra do sítio e de pagamentos da reforma, além de extratos de pedágio que comprovariam que eles também frequentavam a propriedade.