RIO Músico que passou pelo punk (com a banda Test Icicles) e pelo folk-pop (sob a persona Lightspeed Champion), o inglês Dev Hynes, de 30 anos, nunca se conformou com as caixinhas aos quais era confinado. Menos ainda agora, com Freetown sound, seu terceiro álbum na encarnação r&b, Blood Orange. Nele, Hynes combina a herança evidente de Prince (de usar, ambiciosamente, as diversas cores da paleta musical do seu tempo) com uma mensagem de inconformismo em relação aos diversos e perenes cerceamentos (raciais, sociais, sexuais). Um impulso comum a ótimos discos recentes, de Black messiah (DAngelo) e To pimp a butterfly (Kendrick Lamar) ao Lemonade de Beyoncé (como nada é por acaso, o inglês andou colaborando com Solange Knowles, irmã da diva).
As canções não são exatamente o foco de Freetown sound. Não há um candidato cristalino a hit, como era Youre not good enough no álbum anterior, Cupid deluxe. O que está em questão aqui é o clima geral do álbum, uma espécie de desfile de fantasmas do pop negro dos anos 1980, com interpolações jazzísticas, belezas esparsas (como a multiplicação de vozes gospel da faixa de abertura, By ourselves) e intervenções de textos falados (seja de Paris is burning, documentário sobre a cena drag de Nova York, ou um poema sobre a importância da rapper Missy Elliot para a imagem da mulher negra americana).
De qualquer forma, há canções boas de sobra nesse disco que era para ter saído na última sexta, mas foi antecipado para a terça. Por sua sensível tapeçaria sonora e cuidado com os vocais, Augustine pode entrar para a lista de grandes faixas do r&b dos anos 2010, ao lado de Miguel e Janelle Monáe. E.V.P. recicla Prince com distanciamento e personalidade. Hands up estabelece um clima luxuriante para lá de George Michael. E I know é pop barroco que poucos conseguem fazer. É isso: com Freetown sound, Dev Hynes entra para o jogo dos grandes.
Cotação: Ótimo.