Cotidiano

Amante da natureza, Leonardo Fróes lembra de desastre de Mariana

Iniciando as mesas deste sábado na Festa Internacional Literária de Paraty (Flip), Leonardo Fróes contou sobre seu cotidiano no sítio de Secretário, distrito de Petrópolis, e como essa rotina rural influencia no seu processo criativo. Amante da natureza, fez questão de citar a tragédia de Mariana.

? Foi um absurdo completo, um crime contra os moradores e os animais e plantas da região. O Brasil inteiro está sendo escavado; a mineração é uma coisa chocante, dolorosa. Não sei como resolver isso, mas acho que uma solução seria a sociedade consumir menos ? criticou Fróes, que citou um caso semelhante, em menor escala, que ocorreu perto de sua casa de Secretário, na Região Serrana do Rio. ? Um vizinho resolveu fazer uma represa no rio que passa abaixo do meu sítio. Num dia de chuva violenta, a represa de barro se rompeu e as casas de um vilarejo ali próximo foram inundadas. Pessoas perderam eletrodomésticos, bicicletas. Foi uma tristeza.

Em vários momentos, ele leu poemas de sua autoria e contou casos curiosos envolvendo animais e plantas, na conversa mediada por Sergio Cohn. Com um discurso fofo sobre a leveza da vida e fazendo menção diversas vezes a sua mulher Regina D’Olne, o poeta arrancou suspiros e gritinhos de “own” da plateia.

Natural de Itaperuna, Fróes saiu da cidade natal aos nove anos rumo ao Rio. Aos 20 anos, se mudou para Nova York e depois ainda morou na Europa. No início da década de 1970, o poeta se mudou para Secretário, num retorno à vida rural.

? Eu sentia saudade da roça. O sítio, quando cheguei, era um pasto; fiz um trabalho de reflorestamento. Todo o trabalho braçal, com as plantações, era um exercício poético ? explicou.

Impulsivo e emocional, o poeta sempre se apropriou das experiências vividas no campo para criar seus poemas. Mais do que meras descrições dos elementos da natureza, seus textos tratam de sensações e sentimentos.

? Avalio a condição humana também. Os poemas são baseados em experiências que vivi, mas não como descrição. Há um aspecto muito maior – explicou o escritor, que leu, no meio da argumentação, “Mulheres de milho”. ? Esse poema surgiu na minha cabeça quando eu entrei no milharal. O envolvimento com a natureza é sensual porque é sensorial. Me sinto realizado, é uma sensação verdadeira.

Apesar de ter se “refugiado” no campo, Fróes rejeita o rótulo de poeta da “Geração Beat”, movimento de contracultura originado nos EUA. Na vida rural, o poeta diz que aprendeu a valorizar mais a vida.

? Minha poesia se tornou mais otimista e menos crítica. O fato de eu viver recluso, longe do mundo urbano, poderia ser uma semelhança com a Geração Beat, mas acho que, para me proteger, eu me recolhi no campo. E aí descobri que a vida é muito maior que apenas a vida humana ? explicou o escritor, que contou um caso com micos e lembrou que “abelhas não são corruptas’.

Premiado pelo seu trabalho como tradutor, Fróes contou sobre o início da carreira, e disse ser da escola da “fidelidade”.

? A tradução a princípio foi só um meio de ganhar a vida. Comecei com tradução de enciclopédias, em que não podia mudar nada, tem que traduzir fielmente. Essa foi minha escola de tradução. por isso procurei quase sempre seguir o original. Nunca quis me sobrepor ao texto original, numa posição modesta. Como um instrumentista que tem que seguir a partitura.