RIO ? A estátua do Cristo Redentor, símbolo maior do Rio, já foi objeto de numerosas interpretações visuais. Reinaugurado em julho depois de seis anos em obras, o Museu Histórico da Cidade do Rio de Janeiro, na Gávea, abriga uma das mais recentes: a exposição ?Cristo Redentor ? Divina geometria?. Ali, no prédio restaurado, Oskar Metsavaht distribui por três andares uma visão original sobre o monumento, mesclando objetos e documentos históricos a um trabalho autoral em vídeo, fotografia, pintura e instalação.
Os que não acompanham o noticiário de exposições podem se surpreender com o nome do artista por trás da obra. É verdade que por mais de um quarto de século o criador da grife Osklen, fundada em 1989, esteve associado à moda. Mas, de alguns anos para cá, um interesse antigo e genuíno começou a se manifestar, fazendo com que Metsavaht, diretor criativo da marca (ele vendeu 60% do negócio), encarasse de frente o preconceito.
? Estou entrando no trem agora, não espero sentar no primeiro vagão ? diz ele.
O ?agora? remonta ao início de 2014, quando fez uma imersão no Instituto Inhotim, em Brumadinho. Lá, criou uma performance com projeções sobre tecido cujo resultado em vídeo, ?Interface I ? Homem, arte e natureza? foi exibido na mostra ?Made by… Feita por brasileiros?, na Cidade Matarazzo, em São Paulo, com curadoria de Marc Pottier. Na ocasião, Tunga (1952-2016), também na mostra e conhecido pela generosidade com jovens artistas, teria ajudado a quebrar o olhar enviesado de profissionais do meio ao comentar que achava a obra bonita, com conceito e bem-feita, segundo conta Metsavaht.
INTERFACES NA VIDA E NA OBRA
O segundo trabalho visto pelo público, ?Interface II ? Homem, cosmos e floresta?, foi realizado depois de uma experiência com os índios ashaninka, em junho de 2015, e mostrada meses depois na ?Ocupação Mauá?, evento paralelo à ArtRio, realizado pelo Arte Clube Jacarandá, o fundo de investimentos Brazil Golden Art e a om.art, estúdio de arte e projetos especiais de Metsavaht. Ele criou um túnel de voile, através do qual propunha ao visitante experimentar a viagem que ele próprio vivera com os índios. O artista acabou ?absorvido? pelo Jacarandá, associação criada por artistas como Carlos Vergara, Raul Mourão, Afonso Tostes e Cabelo, e participou também da mostra promovida por eles na Villa Aymoré, neste ano.
A palavra que dá nome a suas instalações também está presente em sua trajetória:
? É interessante este momento que estou vivendo, é mais uma interface na minha vida. Passei de médico a designer de moda; e de designer de moda a artista. Mas, em tudo, o cerne do meu trabalho sempre foi o homem e sua relação com o meio.
Gaúcho nascido há 55 anos em Caxias do Sul, filho de um médico e de uma professora de História da Arte, ele veio para o Rio aos 22 anos para terminar na Uerj os estudos de medicina. Especializado em medicina do movimento, integrou em 1987 uma expedição brasileira ao Aconcágua, na qual era responsável pelo condicionamento físico. Na época não havia roupas nacionais para enfrentar baixas temperaturas, e coube a Metsavaht desenvolver os agasalhos. O fato de serem também bonitos desencadeou uma história de sucesso na moda.
A virada (ou interface) agora, portanto, não é a primeira. Para a exposição sobre o Cristo, sua primeira individual, ele se inspirou na arquitetura do monumento e sua simbologia espiritual e religiosa para criar uma mostra em três tempos. No primeiro, ?Construção?, dispõe de maneira própria objetos e registros históricos, fruto de sua pesquisa em acervos como o da Arquidiocese (onde descobriu que a estátua é revestida de milhares de pequenos mosaicos de pedra-sabão) e no próprio museu (um modelo em gesso da cabeça). No segundo, ?Desconstrução?, cria uma instalação em que é visível uma referência recorrente em seu trabalho: o retângulo da face que recorta os olhos; e, no terceiro, ?Reconstrução?, há pinturas, vídeos e fotografias, como as que sugerem a ascensão da estátua.